Por que o aço chinês está tão barato, com forte impacto no Brasil? Entenda
As importações brasileiras do aço produzido na China cresceram 50% neste ano e têm previsão de subirem mais 20% em 2024, segundo o Instituto Aço Brasil (Iabr), caso o governo brasileiro não adote alguma medida para proteger a indústria nacional e impedir essa ‘invasão’ do produto chinês. Gigantes do setor como Usiminas, CSN, Gerdau, ArcelorMittal e Aperam pressionam o governo brasileiro a estipular uma taxa de importação de 25%, o que encareceria o aço importado e estimularia as empresas brasileiras.
Inclusive, a ArcelorMittal confirmou na segunda-feira (11) que estendeu as paradas técnicas, iniciadas em novembro, de suas unidades de Resende (RJ), Piracicaba (SP) e Juiz de Fora (MG) até o fim deste ano. Já o presidente da Usiminas, Marcelo Chara, disse que o alto-forno 1, em Ipatinga, será desligado até o início de 2024, caso não haja um equilíbrio entre demanda e produção. E a Aperam suspendeu investimentos em Timóteo.
Mas afinal, por que o aço chinês está tão barato, levando os dirigentes das grandes siderúrgicas brasileiras a falarem em ‘concorrência desleal’?
1 - Economia chinesa em desaceleração
O primeiro ponto é que a economia chinesa está em desaceleração. De acordo com dados da Statista, o crescimento do país asiático está abaixo de 7% desde 2016 (com exceção de 2021, quando a base de comparação era baixa, pois 2020 foi o ano de início da pandemia de Covid-19).
Em anos anteriores, o país crescia acima de 10%. Por isso, está sobrando aço na China e o país precisa exportar esse excedente, vendendo mais barato.
Das dez maiores empresas produtoras de aço do mundo em 2022, seis eram chinesas. O país é, disparadamente, o maior fabricante desse tipo de produto no mundo.
2 - Aço chinês é subsidiado pelo governo local
Para a China vender o aço com um preço bem mais baixo para outros países, o governo local dá subsídios para as produtoras chinesas. Ele é o controlador da maioria das siderúrgicas do país e determinou a venda do aço nestas condições, em esforço anticíclico para manter a economia aquecida.
“A China está subsidiando enormemente a entrada desse aço, que está chegando aqui às vezes até com preço abaixo do custo de produção. Isso prejudica bastante o setor de siderurgia, que é bem representativo e emprega muitas pessoas”, confirma Fernando Ferrer, analista da Empiricus Research.
3 - Mercado imobiliário na China em crise
O mercado imobiliário chinês, um dos maiores compradores de aço do mundo, enfrenta grave crise econômica desde 2020, quando a Evergrande, uma das maiores empresas do setor, precisou renegociar o pagamento de várias dívidas e pediu socorro ao governo de Guandong, onde fica a companhia.
Em setembro de 2021, a Evergrande não conseguiu quitar mais de US$ 100 milhões aos credores. Na época, a incorporadora tinha mais de um milhão de imóveis inacabados. Nos últimos dois anos, a Evergrande tentou aprovar um plano de recuperação, ainda sem sucesso. Neste ano de 2023, outra gigante do setor imobiliário, a Country Garden, também demonstrou dificuldades e precisou esticar o prazo de pagamento de dívidas. Sem dinheiro para investir em novas obras e com menor crédito nos bancos, as construtoras estão comprando menos aço.
4 - Imposto para comprar aço do exterior é menor no Brasil
O setor nacional do aço sentiu o impacto de recentes alterações de alíquotas do imposto de importação relacionadas a produtos siderúrgicos de outros países, como Estados Unidos e México. Em 2018, os norte-americanos elevaram as tarifas de importação sobre produtos de aço para 25%. O governo mexicano também aumentou, até julho de 2025, a tarifa de importação ao patamar de 25% para vários produtos, entre eles o ferro e aço.
Diante desse cenário, o setor produtivo do aço no Brasil pediu a elevação do imposto de importação no país. A alíquota atual é de 9,6%. Mas em 1º de outubro, o governo brasileiro elevou para até 14% a taxa de importação para 12 produtos da cadeia do aço. No entanto, o imposto cobrado no Brasil ainda é menor do que em outros países, facilitando a compra de aço importado. E como a medida não abrange todos os produtos do setor, algumas empresas ficaram prejudicadas.
"Essa medida não muda em nada a nossa situação, nenhum produto nosso está dentro dessa lista. Se o governo não tomar uma atitude, pode destruir uma indústria estratégica para o país", afirma o diretor-presidente da Aperam, Frederico Ayres Lima.
Dois meses atrás, o presidente-executivo da Gerdau, Gustavo Werneck, chegou a dizer que estava otimista com a possibilidade da criação de uma nova taxa de importação de 25% para a entrada de aço de outros países no Brasil.
"Estamos otimistas que o governo brasileiro vai tomar essa medida... A medida anterior é um passo pequeno, mas é um símbolo de que o tema virou questão urgente em Brasília", afirmou Werneck durante conferência para investidores e analistas.
Executivos das siderúrgicas brasileiras prometem manter a pressão para que o governo aumente a tarifa de importação, uma vez que o aço chinês é subsidiado e não há como a indústria brasileira se manter competitiva.
“A nossa análise é que o Brasil deveria subir essa taxação tal qual os outros países têm feito para 25%. Existe um lobby no sentido positivo das siderúrgicas para tentar de fato proteger o mercado, porque se você tem uma prática tão predatória como está sendo feito, você acaba destruindo toda uma cadeia”, justifica Ferrer, da Empiricus Research.
No entanto, o especialista lembra que alguns setores são beneficiados com o aço importado mais barato, como a indústria automotiva e a construção civil. “Mesmo que beneficie alguns players conjunturalmente, cria distorções muito grandes na indústria. O aço chega a um preço abaixo do custo”.
5 - Aço chinês é produzido com menos cuidados ambientais
Outro fator que pode deixar o aço chinês mais barato na comparação com o brasileiro é a adoção de práticas ESG pelas empresas do Brasil, com maior cuidado ambiental e de sustentabilidade na produção. Enquanto o Brasil já usa energia renovável como o carvão vegetal nos alto-fornos, a China não é tão transparente nessa fabricação do aço.
“Vale lembrar, por exemplo, que grande parte da produção do aço da Gerdau é feita de sucata. O aço chinês muitas vezes é feito à base de minério. Então, quando a gente pensa em práticas ESG também, muito provavelmente foram aplicadas com muito menos rigor no aço chinês do que no local”, conclui Fernando Ferrer.
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