Coluna Alerta Digital - 14/09/2023
- gazetadevarginhasi
- 14 de set. de 2023
- 5 min de leitura

Anonimato na Darkweb e seus desafios para a investigação criminal cibernética
A primeira vez que alguém utiliza um buscador de internet e pesquisa por um termo qualquer, imediatamente ficará impressionado com a quantidade de links e o tempo necessário para a obtenção daquela resposta. Ao pesquisar no Google, por exemplo, pelo termo darkweb, no dia 12 de setembro de 2023, a ferramenta informa ter localizado aproximadamente 4.640.000.000 resultados em 0,30 segundos. É algo realmente impressionante. Mas como funciona isso?
Apesar da complexidade envolvida, podemos resumir da seguinte forma. O mais famoso buscador do planeta rastreia a web continuamente, indexa as informações, processa consultas com base em algoritmos avançados e, em seguida, exibe os resultados mais relevantes para os usuários. A combinação de tecnologia avançada, vastos recursos computacionais e insights contínuos de dados, além de seus segredos comerciais, torna o Google o mecanismo de busca dominante no mundo.
Apesar dessa indexação e velocidade de resposta, acredite ou não, as informações apresentadas não representam muito mais que 4% do conteúdo disponível na internet (Pompéo & Seefeldt, 2013). O que está efetivamente indexado é, por assim, dizer, apenas a pequena ponta de um grande iceberg oculto no fundo do mar cibernético. Se pudéssemos descer abaixo da superfície, chegaríamos à constatação de que existe um vasto oceano de informações conhecido como deepweb ou internet profunda, que depende de outros mecanismos para ser acessada.
Além de representar uma parte significativa da web, a “Deep Web” inclui bancos de dados, arquivos privados, páginas protegidas por senha, desde registros acadêmicos até fóruns privados, e caracteriza-se por não estar indexada por mecanismos de busca convencionais (Salvation DATA, 2023).
Nesse sentido, não há a princípio, qualquer ilicitude no acesso à deepweb. Inclusive pode ser utilizada por jornalistas para troca de informações confidenciais ou por cidadãos que vivem em regime opressivo e que necessitam de alguma forma segura de se comunicar, para o fim de evitar prejuízo mais graves a seus direitos e liberdades fundamentais (National Institute of Justice, 2020). Assim, é correto o entendimento de que a deepweb não é maligna, em sua essência, e tem uma razão que a justifica em diferentes cenários.
Por outro lado, em face do anonimato que propicia, muitos indivíduos veem a deepweb como um espaço adequado para o livre cometimento de ilícitos. E o fazem da forma mais abusiva e nefasta imaginável: do tráfico de órgãos, à contratação de assassinos de aluguel, da venda de drogas ilícitas à produção e compartilhamento de material de abuso sexual infantil, disseminação de malware, ransomware e outros artefatos tecnológicos maliciosos e de alto poder destrutivo.
Notoriamente denominada de “darkweb”, essa parte obscura representa uma pequena seção da deepweb, intencionalmente oculta e inacessível através de navegadores padrão. É aqui que o anonimato se torna uma ferramenta poderosa, tanto para atividades legítimas quanto para ilícitas.
Segundo o Departamento de Justiça dos EUA (U.S. Department of Justice, 2021), a darkweb tornou-se notória por ser um mercado para atividades criminosas, desde a venda de drogas ilícitas até operações de tráfico humano. Em síntese, tudo o que há de mais torpe e abjeto pode ser encontrado naquele local da internet profunda.
Utilizamos aqui uma classificação da darkweb como uma parte da deepweb onde ocorrem ações ilícitas apenas para fins didáticos. Na prática, não há uma divisão clara entre onde começa uma e termina a outra. Por outro lado, com o uso dessa pedagogia linguística, é possível assinalar que a navegação na deepweb pode oferecer benefícios, como maior privacidade e acesso a informações não disponíveis na web convencional. No entanto, também apresenta riscos, como a exposição a conteúdo ilegal ou malicioso e a possibilidade de se tornar alvo de criminosos cibernéticos (Salvation DATA, 2023).
A investigação criminal cibernética tem enfrentado desafios significativos devido especialmente ao anonimato fornecido por plataformas na darkweb. Apesar disso, alguns casos de sucesso têm sido noticiados. Em 2013, o FBI divulgou a prisão de Dread Pirate Roberts, conhecido como o proprietário do Silk Road, o maior mercado online de drogas do mundo, baseado na deepweb e que usava Bitcoins para transações anônimas (Penatti, 2013). Identificado como Ross William Ulbricht, ele conseguiu operar o esquema criminoso entre 2011 e 2013 até que viesse a ser capturado pela famosa agência federal de investigações dos EUA.
Outro caso de sucesso veio a público em 2021, com o encerramento da plataforma Hydra, que era considerada a maior operação de mercado online da darknet, com recebimento de mais de 5 bilhões de dólares em criptoativos desde 2015, após uma investigação do Departamento de Justiça dos EUA (U.S. Department of Justice, 2021). Segundo o órgão, a crescente sofisticação e complexidade da criminalidade cibernética nos tempos atuais impõem a necessidade de abordagens mais sofisticadas também para reprimir essa modalidade criminosa.
Nesse sentido, destacamos que a cooperação policial internacional tem sido fundamental para enfrentar os desafios apresentados pela darkweb. A natureza descentralizada da internet significa que os criminosos podem operar de qualquer lugar do mundo, o que torna a colaboração entre agências e países essencial para o sucesso das investigações (U.S. Immigration and Customs Enforcement, 2021).
É fato que a natureza humana é extremamente complexa, e isso está refletido em ferramentas tecnológicas como a deepweb e a darkweb. Ao buscar garantir um mínimo anonimato e de privacidade, cada vez mais escassa, o cidadão pode encontrar algum refúgio, mas também riscos significativos em tais plataformas.
O acesso à deepweb ou mesmo à darkweb não é ilícito, por si mesmo, exceto se prevista a forma comissiva por omissão, no último caso. Em direito penal é imprescindível que se punam condutas, dolosas ou culposas, conforme a hipótese ilícito-típica. Independente dessas questões jurídicas, o simples fato de ser eventualmente encontrado no local de crime cibernético durante a execução de uma medida cautelar ou de investigação criminal, pode ser, sim, uma grande dor de cabeça para aqueles que não tem interesse no cometimento de crimes.
Comungamos com a importância de haver tecnologia para garantir que os usuários possam continuar a navegar com segurança e anonimato na rede mundial de computadores. Por outro lado, defensores extremistas da privacidade não podem esperar que as autoridades quedem silente diante da criminalidade que dela se beneficia.
É imprescindível a continuidade das pesquisas e do desenvolvimento de métodos e técnicas inovadores, capazes de viabilizar o enfrentamento da criminalidade cibernética, esteja onde estiver, como mandamento do direito e garantia fundamental à segurança.

Fontes consultadas:
National Institute of Justice. (2020). Taking on the Dark Web: Law Enforcement Experts ID Investigative Needs. [Online]. Disponível em: https://nij.ojp.gov/topics/articles/taking-dark-web-law-enforcement-experts-id-investigative-needs
Pompéo, W. A.; Seefeldt, J. P. (2013). Nem tudo está no Google: deep web e o perigo da invisibilidade. In: Congresso Internacional de Direito e Contemporaneidade. Santa Maria: UFSM.
Salvation DATA. (2023). Investigating the Dark Web: What Law Enforcement Personnel Should
Know. [Online]. Disponível em: https://www.salvationdata.com/work-tips/investigating-dark-web/
U.S. Department of Justice. (2021). Justice Department Investigation Leads to Shutdown of Largest Online Darknet Marketplace. [Online]. Disponível em: https://www.justice.gov/opa/pr/justice-department-investigation-leads-shutdown-largest-online-darknet-marketplace
U.S. Immigration and Customs Enforcement. (2021). Darknet. [Online]. Disponível em: https://www.ice.gov/features/darknet
Penatti, G. (2013). Como o FBI encontrou e prendeu o dono do Silk Road. Tecnoblog. https://tecnoblog.net/noticias/2013/10/02/silk-road-ross-ulbricht-preso
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