Escola é condenada a pagar pensão vitalícia a aluno que perdeu a visão de um olho
gazetadevarginhasi
há 14 minutos
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Por Dr. João Valença
A decisão recente do Superior Tribunal de Justiça que condenou uma escola ao pagamento de pensão vitalícia a um aluno que perdeu a visão de um dos olhos em um acidente escolar vai além de um caso isolado. Ela reacende uma discussão essencial sobre responsabilidade civil em ambientes educacionais, a proteção integral da criança e do adolescente e o reconhecimento jurídico da incapacidade permanente, mesmo quando não há invalidez total para o trabalho.
O caso chama atenção não apenas pela gravidade da lesão, mas pelo impacto duradouro que um acidente ocorrido na infância pode gerar ao longo de toda a vida. A perda parcial da visão compromete capacidades, limita escolhas profissionais futuras e impõe restrições que acompanham a vítima permanentemente. A Justiça, ao reconhecer esse cenário, reforça que o dano não se encerra no momento do acidente.
Quando o ambiente escolar falha, o dever de indenizar se impõe
Segundo o entendimento consolidado pelo STJ, a escola tem dever objetivo de vigilância sobre seus alunos enquanto eles estão sob sua responsabilidade. Isso significa que, ocorrendo um acidente grave dentro do ambiente escolar, não é necessário provar culpa direta, bastando demonstrar o dano e o nexo com a atividade educacional.
No caso analisado, o aluno sofreu um acidente que resultou na perda definitiva da visão de um olho. A Corte reconheceu que a lesão ultrapassa o conceito de dano estético ou moral isolado, pois interfere diretamente na capacidade funcional, na autonomia e nas oportunidades futuras do indivíduo. Por isso, além de indenizações tradicionais, foi fixada pensão vitalícia, justamente para compensar os efeitos econômicos permanentes da limitação. Essa decisão reforça um ponto sensível: a escola não responde apenas por danos imediatos, mas também pelos reflexos futuros e continuados do acidente.
A perda parcial da visão e o conceito jurídico de incapacidade permanente
Um dos aspectos mais relevantes do julgamento está no reconhecimento de que a incapacidade permanente não significa incapacidade absoluta. A vítima não precisa estar totalmente impedida de trabalhar para que exista direito à pensão. Basta que haja uma redução definitiva da capacidade laboral ou funcional, ainda que parcial.
Esse entendimento dialoga diretamente com o conceito de benefício por incapacidade permanente, amplamente discutido no Direito Previdenciário. A incapacidade permanente é caracterizada quando a pessoa sofre uma limitação irreversível que compromete, de forma contínua, sua aptidão para o trabalho ou para atividades da vida cotidiana, mesmo que ainda consiga exercer alguma atividade.
No campo da responsabilidade civil, essa lógica é aplicada para justificar a pensão vitalícia: a indenização mensal busca compensar aquilo que a vítima deixará de ganhar ou terá dificuldade de alcançar ao longo da vida por conta da sequela.
Pensão vitalícia não é prêmio, é compensação proporcional ao dano
A decisão do STJ também ajuda a combater uma visão equivocada de que a pensão vitalícia seria um benefício excessivo. Na realidade, ela é um instrumento de equilíbrio, destinado a mitigar os efeitos econômicos de um dano permanente causado por terceiro.
No caso de crianças e adolescentes, essa análise se torna ainda mais complexa. O Judiciário precisa projetar os impactos futuros de uma limitação adquirida precocemente, considerando que escolhas profissionais, oportunidades de renda e até condições de empregabilidade podem ser afetadas décadas depois do acidente. Por isso, a pensão não se vincula apenas ao presente, mas ao potencial de perda futura, reconhecendo que a sequela acompanha a vítima por toda a vida.
A responsabilidade das instituições e a proteção integral do aluno
A decisão também reafirma o papel das instituições de ensino dentro do sistema de proteção integral previsto no Estatuto da Criança e do Adolescente. Ao assumir a guarda temporária do aluno, a escola assume também o dever de garantir um ambiente seguro.
Quando esse dever é violado, a responsabilização não é apenas jurídica, mas social. Casos como esse demonstram que falhas de vigilância podem gerar consequências irreversíveis, e que a reparação deve ser proporcional à gravidade do dano causado. O entendimento do STJ sinaliza que o Judiciário está atento à necessidade de respostas eficazes e duradouras, especialmente quando o dano compromete toda uma trajetória de vida.