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Inventário extrajudicial e sucessão rural, quando simplificação convive com riscos estruturais

  • gazetadevarginhasi
  • há 11 horas
  • 3 min de leitura


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Uma análise sobre o novo cenário da partilha patrimonial, a modernização legislativa e os impactos silenciosos para produtores, famílias e advogados.

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por Dr. João Valença

A recente aprovação, pela Câmara dos Deputados, do relatório ao Projeto de Lei 3720/2025, que institui um procedimento simplificado de inventário extrajudicial para pequenas propriedades rurais, inaugura uma fase de transformação relevante no tratamento das sucessões no meio agrário. Desde a Lei 11.441/2007, que abriu espaço para o inventário extrajudicial em cartório, a via administrativa já se consolidava como alternativa mais célere e menos onerosa ao procedimento judicial. Com o novo projeto, entretanto, a sucessão de propriedades rurais até quatro módulos fiscais recebe disciplinamento especial, criando expectativas de desburocratização e redução de custos.
Apesar do entusiasmo inicial, o movimento exige cautela. As normas do Conselho Nacional de Justiça, a legislação registral e os requisitos ambientais e agrários continuam impondo exigências técnicas que não desaparecem com a simplificação procedimental.
 
Inventário extrajudicial, modernização real ou expectativa excessiva?
O inventário extrajudicial, regulamentado pela Resolução CNJ 35/2007, pressupõe herdeiros capazes, inexistência de testamento e plena concordância. Trata-se de procedimento que, embora rápido, exige documentação detalhada, certidões atualizadas, quitação fiscal e conformidade registral, conforme determina a própria Lei de Registros Públicos.
O PL 3720/2025 flexibiliza esse caminho ao permitir que pequenas propriedades rurais sejam inventariadas em cartório sem advogado, desde que haja consenso entre os herdeiros e que o imóvel se enquadre no limite territorial previsto. A escritura resultante poderá, inclusive, servir de título para atualização cadastral junto ao INCRA e à Receita Federal.
A proposta é celebrada por sua promessa de celeridade e economia, mas a realidade da sucessão rural é mais densa. Imóveis rurais costumam envolver passivos ambientais, exigências de georreferenciamento, reservas legais, módulos fiscais e obrigações tributárias específicas. A simplificação não elimina essas camadas, apenas altera o rito.
 
Pequenas propriedades e a zona de conforto da sucessão simplificada
A exceção legislativa não alcança todas as situações. Propriedades maiores, herdeiros incapazes, existências de testamentos, conflitos familiares ou pendências fiscais afastam a possibilidade de utilizar o novo modelo. Ainda assim, muitos produtores poderão interpretar a simplificação como autorização para dispensar cuidados essenciais, o que aumenta o risco de partilhas inconsistentes, escrituras incompletas e obstáculos futuros no registro de imóveis.
Além disso, as regras sucessórias do Código Civil continuam válidas. A transmissão da herança ocorre automaticamente, mas a formalização exige precisão documental. Em áreas rurais, isso significa observar matrícula atualizada, verificar a cadeia dominial, regularizar obrigações ambientais e atualizar cadastros obrigatórios.
 
Convergência de informalidade e governança patrimonial
A junção entre inventário extrajudicial e sucessão rural simplificada evidencia que, quanto menor parece a burocracia, maior pode se tornar o risco de erros silenciosos. A ausência de advogado, ainda que permitida pelo PL, não reduz a complexidade jurídica do patrimônio rural. Omissão de bens, falta de certidões, ausência de concordância real entre os herdeiros, problemas ambientais ou pendências tributárias podem gerar exigências posteriores, anulação de partilha ou travas no registro.
A governança patrimonial torna-se, assim, indispensável. Levantamento documental, análise de passivos, conferência de matrícula, verificação de requisitos cadastrais rurais e atenção tributária são etapas que continuam obrigatórias, independentemente da via extrajudicial.
 
O que esse cenário ensina sobre sucessão, patrimônio e responsabilidade jurídica
O novo modelo exige equilíbrio entre praticidade e técnica. A via simplificada é oportunidade real, mas não é imunidade a riscos. Famílias e produtores precisam compreender que inventário não é mera formalidade, mas instrumento de segurança patrimonial.
Ignorar obrigações ambientais, registrar bens de forma incompleta ou subestimar a necessidade de assistência qualificada pode transformar uma partilha simples em litígio prolongado. Em um contexto onde direito agrário, registral e sucessório se encontram, a prevenção continua sendo a única estratégia capaz de evitar prejuízos irreversíveis.

REFERÊNCIAS
AGÊNCIA CÂMARA DE NOTÍCIAS. Comissão aprova inventário extrajudicial simplificado para pequenas propriedades rurais. Artigo digital, 2025. Disponível em: https://www.camara.leg.br/noticias/1223265-comissao-aprova-inventario-extrajudicial-simplificado-para-pequenas-propriedades-rurais. Acesso em: 24 nov. 2025.
BRASIL. Lei nº 11.441, de 4 de janeiro de 2007. Artigo digital. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2007/lei/l11441.htm. Acesso em: 24 nov. 2025.
CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA (Brasil). Resolução nº 35, de 24 de abril de 2007. Artigo digital. Disponível em: https://atos.cnj.jus.br/atos/detalhar/94. Acesso em: 24 nov. 2025.
VALENÇA, João. Inventário extrajudicial: como fazer? Artigo digital, 2025. Disponível em: https://vlvadvogados.com/inventario-extrajudicial/. Acesso em: 24 nov. 2025.
 

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