Coluna Jurídica Gazeta - 05/11/2025
- gazetadevarginhasi
- há 1 dia
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Mulher presa injustamente por seis anos morre dois meses após absolvição: caso expõe falhas nas prisões preventivas prolongadas
A morte de uma mulher que passou seis anos presa injustamente no Rio Grande do Sul, apenas dois meses após ser absolvida pelo Tribunal do Júri, reacendeu o debate sobre o uso excessivo da prisão preventiva no Brasil. Ela foi acusada de envolvimento em um homicídio e permaneceu presa durante todo o processo, mesmo sem uma condenação definitiva. Apesar da ausência de provas concretas, sua liberdade só veio quando foi considerada inocente por unanimidade. É uma história que simboliza o peso de um sistema que ainda prende para, só depois, investigar.
Durante o período em que esteve reclusa, a mulher teve a saúde física e emocional profundamente comprometida. Descobriu um câncer agressivo pouco antes de sua libertação e, infelizmente, não resistiu. Sua morte, após anos de sofrimento, representa mais do que uma tragédia individual, revela o impacto devastador de prisões mantidas sem fundamento sólido, que ferem o princípio constitucional da presunção de inocência e corroem a confiança na Justiça.
Prisão preventiva: quando a exceção vira regra
A prisão preventiva é uma medida prevista no artigo 312 do Código de Processo Penal, criada para proteger a sociedade e garantir o andamento das investigações em casos realmente graves. Porém, na prática, ela tem sido aplicada como punição antecipada, o que distorce completamente sua finalidade. O processo penal não existe para castigar antes da condenação, mas para apurar os fatos com base em provas e assegurar um julgamento justo.
Nenhum cidadão deve ser privado da liberdade sem que haja motivo concreto e proporcional. A lei é clara, a prisão preventiva deve ser reavaliada periodicamente e revogada quando não houver mais risco de fuga, ameaça à instrução do processo ou à ordem pública. Quando isso não acontece, a medida se transforma em prisão prolongada e abusiva, o que fere frontalmente o devido processo legal.
O abuso da prisão preventiva e as falhas do sistema
Infelizmente, casos como esse não são isolados. O Brasil está entre os países com maior número de presos provisórios no mundo, e uma parcela expressiva desses detentos é posteriormente absolvida. O encarceramento excessivo tem raízes na pressa de oferecer respostas à sociedade, mas acaba comprometendo direitos fundamentais e sobrecarregando um sistema penitenciário já em colapso.
A prisão preventiva não pode ser instrumento de conveniência ou resposta à opinião pública. Quando usada sem base concreta, ela perde sua função cautelar e assume caráter punitivo, transformando-se, de fato, em uma condenação antes do julgamento. Essa distorção mina a credibilidade da Justiça e destrói vidas que, mais tarde, se revelam inocentes.
Responsabilidade do Estado e reparação
Em situações como a da mulher gaúcha, o Estado tem responsabilidade objetiva pelos danos causados. Manter alguém preso sem provas suficientes é violar direitos humanos básicos. Cabe ao poder público indenizar, sim, mas a reparação financeira jamais será capaz de devolver o tempo perdido ou restaurar a dignidade ferida.
Mais do que reparar, é preciso prevenir. Isso exige que juízes e promotores cumpram rigorosamente a obrigação de reavaliar as prisões preventivas, e que a defesa técnica atue com firmeza para contestar detenções infundadas. O respeito ao devido processo legal e à presunção de inocência não é um favor, é o que sustenta o Estado Democrático de Direito.
O alerta deixado pelo caso
A morte dessa mulher, após seis anos de prisão injusta, é um alerta grave sobre o que acontece quando o sistema falha em seu dever de garantir justiça com humanidade. O combate ao crime deve ser firme, mas nunca à custa da dignidade e da liberdade de inocentes.
É urgente repensar a cultura de encarceramento preventivo e fortalecer alternativas como as medidas cautelares diversas da prisão, o monitoramento eletrônico e a revisão periódica das detenções. Nenhuma sociedade é justa quando prefere a pressa em punir à responsabilidade de julgar com equilíbrio.
Casos como esse expõem a face mais dolorosa das falhas institucionais, a perda irreversível de uma vida que o próprio Estado deveria ter protegido. Que sirva, ao menos, como um marco de reflexão sobre a necessidade de reconstruir um sistema penal mais técnico, humano e comprometido com a verdade e com a justiça.







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