Opinião com Luiz Fernando Alfredo - 16/10/2025
- gazetadevarginhasi
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Entre promessas de ruptura e a necessidade de institucionalidade
O Brasil se encontra, segundo a leitura mais simples, numa encruzilhada que nĆ£o Ć© de novidade, mas cuja intensidade parece subir a cada temporada eleitoral. Em vez de resolver problemas de governanƧa, de seguranƧa pĆŗblica ou de sustentabilidade fiscal, o paĆs acumula sinais de desgaste institucional, polarização acentuada e uma certa fadiga da confianƧa. NĆ£o Ć© um āfim do mundoā, Ć©, porĆ©m, um alerta estratĆ©gico: sem voto auditĆ”vel, sem uma linha clara de responsabilização polĆtica e sem uma trajetória de reformas que nĆ£o dependa apenas de vaidades biogrĆ”ficas, o risco de cada crise escalar para um conflito constitucional Ć© real ā e o custo para a sociedade, inevitavelmente, alto.
O que estĆ” em jogo nĆ£o Ć© apenas quem estĆ” no poder, mas como ele Ć© legitimado, fiscalizado e removĆvel. HĆ”, hoje, uma sobreposição de crises que se alimentam mutuamente: a percepção de uma atuação externa que descola da prĆ”tica de governanƧa, a sensação de que polĆticas pĆŗblicas foram desarticuladas ou mal alinhadas, e uma visĆ£o de que a justiƧa e a educação caminham sob o peso de cortes ou de disputas ideológicas que parecem nĆ£o ter fim. Quando falamos em āterceirizaçãoā de decisƵes estratĆ©gicas para fora da fronteira institucional ā STF, Congresso, Executivo, imprensa ā sem que haja um pacto mĆnimo de convivĆŖncia democrĆ”tica, abrimos espaƧo para a politização de questƵes jurĆdicas e para a fadiga cĆvica que favorece soluƧƵes simplistas, promessas de āfechar a portaā ou de apontar culpados sem oferecer caminhos de construção.
O cenĆ”rio nĆ£o desaparece por decreto. Mesmo com uma eventual mudanƧa de narrativa, os problemas permanecem: inseguranƧa pĆŗblica, fragilidade da seguranƧa jurĆdica, cortes em Ć”reas cruciais como educação e saĆŗde, e uma economia que, para alĆ©m de nĆŗmeros, traduz uma sensação de estagnação para grande parte da população. A proximidade de novas eleiƧƵes nĆ£o Ć© apenas uma contagem de dias: Ć© um teste de maturidade institucional. E aqui reside o nó: sem voto auditĆ”vel, sem mecanismos transparentes de responsabilização, a confianƧa pĆŗblica fica exposta a dĆŗvidas que corroem a legitimidade de qualquer solução ā seja ela mais Ć esquerda ou mais Ć direita.
A atualidade parece apontar para uma tendĆŖncia de acirramento: a esquerda que se percebe desafiada por um ativismo judicial que nĆ£o se desdobra apenas no papel; a direita que exige firmeza e interpretaƧƵes rĆ”pidas; o empresariado e a sociedade civil que pedem previsibilidade; e, no meio, o aparato estatal, cujo funcionamento, em vez de solucionar, muitas vezes parece ser motivo de discórdia. Em meio a isso, o exĆ©rcito e as estruturas de defesa civil e institucional permanecem como cartas marcadas em silĆŖncio; o silĆŖncio pode ser uma forma de contenção, mas tambĆ©m um risco de desencadeamento de aƧƵes nĆ£o previstas, quando a pressĆ£o social excede os canais institucionais disponĆveis.
Quais são, então, as escolhas responsÔveis, para não transformar uma crise recorrente em uma conflagração permanente?
ReforƧar a governanƧa com voto auditĆ”vel e transparĆŖncia: sistemas de votação confiĆ”veis, auditorias independentes e protocolos de contestação que sejam compreendidos pela sociedade como equitativos. A legitimidade do sistema Ć© a base de qualquer acordo polĆtico duradouro.
Fortalecer a independência e o papel das instituições: Congresso, STF, Ministério Público, JudiciÔrio e Executivo devem atuar como contrapesos, não como palcos de disputa pessoal ou de protagonismo. A cooperação institucional é condição para qualquer solução de médio prazo.
Impor responsabilidade e consequências: sem anistias genéricas ou soluções de curto prazo que deixem para amanhã o que é solução de fundo, é essencial que haja processos democrÔticos de responsabilização quando houver desvios ou abusos de poder, respeitando o devido processo legal.
Investir em polĆticas pĆŗblicas com efeitos concretos: educação, saĆŗde, seguranƧa, infraestrutura ā polĆticas que atinjam a vida cotidiana do cidadĆ£o e devolvam confianƧa na capacidade do Estado de reagir.
Fomentar diĆ”logo responsĆ”vel e governanƧa de crise: espaƧo pĆŗblico para o debate, mediadores reconhecidos, e um pacto mĆnimo que permita governabilidade sem abrir mĆ£o de direitos civis e democrĆ”ticos.